quarta-feira, 12 de maio de 2010

Associações pedem investigação de grupos de mídia

Abert e ANJ querem que Procuradoria fiscalize editoras que teriam mais do que 30% de capital estrangeiro.

BRASÍLIA. As Associações Brasileira das Emissoras de Rádio e TV (Abert) e Nacional dos Jornais (ANJ) entraram com duas representações junto à ProcuradoriaGeral da República pedindo que o Ministério Público investigue se a Empresa Jornalística Econômico S.A. — que, de origem portuguesa, edita o jornal “Brasil Econômico” e comprou os impressos do grupo “O Dia” — e a Terra Networks S.A. — que, de origem espanhola, controla o site Terra — estão infringindo o artigo 222 da Constituição.

Este impõe restrições ao capital estrangeiro no controle de meios de comunicação.

Pelo artigo, o controle dos meios de comunicação deve ser exercido por brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos, e a participação de capital estrangeiro está limitada a 30% do total. A ANJ assina sozinha a representação contra a Econômico e, em associação com a Abert, contra a Terra Networks.

Ambas as empresas, sustentam os documentos, são controlados por grupos estrangeiros.

O Terra não vai se pronunciar porque não recebeu qualquer comunicação oficial a respeito da representação. Procurado, o representante do “Brasil Econômico” não retornou até o fechamento desta edição.

“Raras vezes se tem visto tão abertamente a infringência da ordem jurídico-constitucional e legal, no que tange a comunicação social, por parte de estrangeiros”, diz a representação da ANJ.

Nos ofícios, argumenta-se ainda que não são seguidos pelos dois grupos os preceitos de que a gestão e a responsabilidade editorial fiquem nas mãos de brasileiros e que não é justa a concorrência entre empresas que seguem regras distintas, inclusive do ponto de vista financeiro.

Abert cobra ação do governo federal A partir das representações, a Abert poderá até recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) para brecar a proliferação de portais de jornalismo na internet controlados por empresas estrangeiras.

A linha de atuação da entidade no momento depende da interpretação que o Ministério Público dará ao assunto.

A Abert também cobra uma atuação enérgica do governo federal e do Congresso Nacional para coibir o desrespeito à lei que assegura aos brasileiros o controle das empresas de comunicação.

A Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara já enviou ofício cobrando uma posição do Ministério das Comunicações e dando conhecimento dessa cobrança ao Ministério da Justiça, à AdvocaciaGeral da União (AGU), à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e à própria PGR.

— A internet não é uma terra sem lei. Algum órgão neste país, seja do poder Executivo, seja do poder Legislativo, tem que fazer valer uma regra que está na Constituição. Uma Adin vai depender da avaliação do Ministério Público — disse Daniel Slaviero, presidente da Abert.

Para Slaviero, o não cumprimento das normas estabelecidas na Constituição enfraquece o direito à propriedade, torna ainda mais precário o direito autoral e alimenta concorrência desleal entre empresas num mesmo mercado. Luís Roberto Barroso, professor de Direito Constitucional da Uerj, considera essencial que as autoridades brasileiras façam cumprir as regras estabelecidas no artigo 222 da Constituição, “que fala em meios eletrônicos”: — A regra é claríssima.

Para ele, garantir a propriedade e administração de empresas de comunicação por brasileiros é uma forma de se proteger a cultura e a soberania nacional: — Nenhum país civilizado do mundo permite que as empresas jornalísticas sejam controladas por estrangeiros. Nenhum país deseja que sua agenda política ou social seja controlada por estrangeiros — disse Barroso, que participou do seminário “Cultura Sustentável — Brasil: Um caleidoscópio cultural”.

Promovido pelo Senado, o seminário teve como objetivo estimular o debate sobre direitos autorais e jornalismo na internet.

O presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), entende que não é possível abrir mão do controle de empresas de comunicação por parte de brasileiros. Sarney argumenta ainda que algumas medidas são necessárias para conter a pirataria e a violação dos direitos autorais com a reprodução indiscriminada de textos e imagens na internet: — Hoje um dos temas que mais se discute é como nós vamos enfrentar essas fronteiras, que de certo modo abalam as estruturas culturais dos países.

Durante o debate, surgiram questões sobre como garantir o direito autoral diante da extrema facilidade de cópia e reprodução de obras de arte e textos jornalísticos, entre outras produções intelectuais na rede. O entendimento é que o Brasil ainda estaria muito atrasado em relação a outros países que já amadurecem instrumentos de controle e remuneração dos direitos autorais, como EUA, Europa e Japão.

Para o advogado João Carlos Muller, da Associação Brasileira dos Produtores, os direitos autorais podem ser protegidos a partir da fiscalização sobre os provedores.

— A tecnologia está criando facilidade para que as pessoas tenham acesso às obras pela internet, mas também cria meios que facilitam o controle.

Só no Brasil não estão sendo criadas leis para proteger os direitos autorais — reclamou o compositor Fernando Brant, que participou do seminário.

O ex-presidente da Câmara Aldo Rebelo (PCdoB-SP) acredita que não basta assegurar a brasileiros o controle da propriedade dos meios de comunicação.

Rebelo entende que para preservar a cultura nacional é importante garantir a presença de brasileiros em outros setores, como, por exemplo. a publicidade.

Para o deputado, agências de publicidade também têm forte influência sobre o comportamento de parte da sociedade.

— A própria imprensa deve refletir sobre o estado geral da arte — concluiu.

Por Jailton de Carvalho e Mônica Tavares
Jornal O Globo dia 12/05/2010

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